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sexta-feira, 18 de junho de 2010

Falta-nos reflexão de Vera Corazza

Falta-nos reflexão, pensar, pensar

A triste noticia da morte de José Saramago me fez lembrar o homem simples e humilde que conheci em abril de 1999, na ocasião que recebeu o título de doutor honoris causa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Ele teve outras vezes em Porto Alegre, mas um momento que me marcou como grande aprendizagem e felicidade de poder assistir foi a Conferência Quixote e Utopia, ao lado de Eduardo Galeano, no Fórum Social Mundial de 2005, em Porto Alegre. Nesta conferência, a relevância da obra de Cervantes foi destacada como um exemplo de um sonhador, de alguém queria ver um mundo mais justo. A idéia de utopia tão importante para que as mudanças ocorram foi celebrada e destacada como um caminho que deve estar sendo sempre construído.

Saramago começou sua fala polemizando e anunciou duas notícias ruins: - “Não sou um utopista e utopia não existe”. Em seguida explicou, “a utopia é um lugar distante a ser alcançado e de fato não existe e, portanto, eu não poderia ser um utopista”. Ele defendeu que “não devemos esperar alcançar nossas utopias, mas sim construir a mudança a cada dia, pois devemos mudar o hoje para termos um amanhã melhor”.

"O que transformou o mundo não foi a utopia, mas a necessidade. Se a realização de nossas utopias ocorressem em breve não se chamariam de utopia, mas de trabalho e dedicação! Sugiro a retirada desta palavra do dicionário".

"O discurso político manipula, existe apenas para esconder algo. Essa é a arte de camuflar a verdade. Quem é que escolhe os líderes das organizações internacionais? Onde está a democracia?"

"Nossas democracia estão amputadas, foram seqüestradas, pois hoje nossos poderes como cidadãos consistem em trocar um governo que não gostamos por outro que não conhecemos. Precisamos fazer algo modificar e não ficar apenas falando utopia, utopia....".



Em 2008, numa entrevista, ele afirmou que "a história da humanidade é um desastre é um desastre contínuo. Nunca houve nada que se parecesse com um momento de paz." E que "nós não merecemos a vida". Segundo ele, “os instintos servem melhor aos animais do que a razão aos homens.” O animal mata para sobreviver, para se alimentar. E nós porque matamos? Vivemos na violência. “Não usamos a razão para defender a vida; usamos a razão para destruí-la de todas as maneiras”, disse ele.

Em outras palavras, Saramago enfatizou que não podemos abdicar da propriedade, essencialmente humana que é pensar. Nós não pensamos mais, reproduzimos uma informação sem ao menos compreender o que significa. Pensar é fundamental e necessário. “Acho que na sociedade atual nos falta filosofia. Filosofia como espaço, lugar, método de refexão, que pode não ter um objetivo determinado, como a ciência, que avança para satisfazer objetivos. Falta-nos reflexão, pensar, precisamos do trabalho de pensar, e parece-me que, sem ideias, nao vamos a parte nenhuma.” Revista do Expresso, Portugal (entrevista), Outubro de 2008.



Em 2009, no aniversário de Porto Alegre, José Saramago disse que “é uma cidade com um invulgar toque de humanidade".



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